Mira Sorvino Embaixadora da Boa Vontade do UNODC de Combate ao Tráfico de Seres Humanos apela aos Governos para combater este problema com mais empenho.
Em entrevista dada nesta sexta-feira (8), Mirna Sorvino afirmou que apesar dos progressos, os governos precisam fazer muito mais para combater o tráfico de pessoas e destacou a impunidade como uma das principais preocupações. As declarações foram dadas durante visita ao Centro Internacional de Viena, na Áustria.“Devemos garantir que recomendações, políticas, leis e financiamento sejam colocados em prática, não só palavras. Governos devem perseguir vigorosamente grupos criminosos envolvidos neste comércio”, avaliou Sorvino
Cobrando mais assistência às vítimas, Sorvino destacou que 16% dos países que forneceram dados para o documento não registram uma única condenação por tráfico de pessoas no mesmo período.(ONU)
SITUAÇÃO DO BRASIL NO COMBATE AO TRÁFICO DE CRIANÇAS
Recentemente, DESAPARECIDOS DO BRASIL fez um levantamento da situação no Brasil em relação ao TRÁFICO DE CRIANÇAS, e os resultados não são animadores.
QUADRO ATUAL -
1 – A nova Lei de Adoção teve algum reflexo positivo para
evitar/combater o Tráfico de Crianças?
DB – Como sabemos, o tráfico de crianças visa, sobretudo a lucratividade,
sendo responsável por 27% das vítimas do tráfico, segundo relatório da UNODC em
uma pesquisa realizada em várias partes do mundo, entre 2007 e 2010. As
crianças do sexo feminino representam a maior parte, cerca de dois terços das
crianças traficadas.
O Brasil não tem estatísticas ou
dados aproximados sobre o número de tráfico de pessoas, sejam adultos ou
crianças e adolescentes. Os dados que
existem não condizem com a realidade, são baseados em denúncias ou atendimento
às vítimas. As milhares de crianças desaparecidas no Brasil fazem parte dessa
realidade. A maior parte das
estatísticas se refere ao tráfico de pessoas além das fronteiras e são
imprecisas. Em 2003 estimava-se mais de um milhão de crianças traficadas anualmente
em todo o mundo.
A antiga Lei ou Código do Menor, de
1979, sem dúvida favorecia a prática das adoções ilegais através de advogados,
que forneciam em poucos dias, aos casais estrangeiros uma escritura de adoção, cobrando
um preço altíssimo por esse ‘’trabalho’’, mediante o ‘’consentimento’’ da mãe
biológica, que era obtido através de coação ou pequeno favorecimento
financeiro. Quando a demanda era muito grande, os bebês eram [são]
sequestrados, ou dados como mortos nas maternidades com a conivência de médicos
e enfermeiros e vendidos para famílias estrangeiras.
Nos anos 80, o tráfico de bebês através
desse meio, atingiu níveis assustadores, dando ao Brasil o título de
“Exportador de Bebês”, obrigando o governo brasileiro a tomar providências,
quando então foi elaborado o ECA,
Estatuto da Criança e Adolescente, modificando aspectos referentes à Lei
da Adoção, facilitando-a para famílias brasileiras e estrangeiras, com o
intuito de dificultar a ação das quadrilhas do tráfico.
Apesar das novas leis, o tráfico de
bebês, para adoção internacional por meios ilegais, continua em todas as regiões
do país, principalmente no Sul, pela preferência dos casais estrangeiros por
crianças de descendência europeia. Já
nas demais regiões, Norte, Nordeste, Centro Oeste e Sudeste, o sequestro de
crianças se direciona ao turismo sexual, lenocínio e trabalho escravo.
As adoções ilegais continuam em alta
e as quadrilhas utilizam de subterfúgios para escapar da polícia. Um dos meios
utilizados é o registro direto do bebê pela família adotante, com ajuda de
profissionais corruptos, sem passar pelo processo de adoção.
2 – Tem notícias de quantas condenações existem no Brasil envolvendo
“tráfico de crianças”?
DB – O Brasil não cumpre a contento as normas internacionais para eliminar
o tráfico de crianças, embora as autoridades se esforcem para investigar crimes
relacionados ao tráfico sexual e adoções ilegais, mas não existem dados
precisos sobre processos e condenações por esses crimes. Também não há abrigos
suficientes e tampouco serviços especializados do governo para essas vítimas.
Em 2011, foram identificados através das ações da polícia federal, 2.800
vítimas do tráfico de crianças por delegacias de 14 estados e apenas nove
condenações foram confirmadas. O número
real é uma incógnita e crianças continuam desaparecendo, sem que possam ser
encontradas.
3 – Qual maior tipo de tráfico, com relação às crianças e adolescentes:
Tráfico de órgão, sexual, trabalho escravo, adoção ilegal?
DB – Como não existem estatísticas
reais, nos baseamos pelas denúncias recebidas e ocorrências registradas em
delegacias e publicadas na mídia. Todas
as modalidades do tráfico de crianças envolvem um comércio bilionário e somente
com um trabalho sério do governo, poderá se conter esse crime hediondo que atinge milhares de
crianças e adolescentes no Brasil.
Conforme explanado acima, cada região
brasileira é alvo de algum tipo de comércio com crianças. Já foram identificadas
no Brasil, 241 rotas do tráfico humano. Nessa pesquisa constam mulheres,
crianças e adolescentes para fins de exploração sexual. 110 rotas estão
relacionadas ao tráfico interno, (Norte 76, Nordeste 69, Sudeste 35,
Centro-oeste 33 e Sul 28). As outras 131
rotas são relacionadas ao tráfico internacional (mulheres e crianças incluindo
homossexuais) para fins de prostituição.
Eventualmente ouvem-se notícias de alguma
prisão de chefes do tráfico de pessoas, mas não permanecem muito tempo
presos. Em Manaus (AM), vivenciamos uma
situação crítica atualmente, envolvendo meninas índias de 10/12 anos sendo aliciadas,
sequestradas e exploradas pela rede de
prostituição. Onde estão as autoridades e os Direitos Humanos?
O trabalho escravo e semiescravo está
no mesmo patamar da escravidão, que é o cerceamento total da liberdade,
submetendo a criança a trabalhos nocivos, cruéis e forçados, em conflitos
armados, em prostituição, pornografia de menores e atividades ilícitas como
produção e tráfico de drogas. É decorrente
da venda e tráfico de menores e deve ser combatido com prioridade. O artigo 149 do Código Penal prevê de dois a oito anos de
cadeia para quem se utilizar dessa prática. Em casos de crianças a pena
aumenta. Não temos um número estimado de escravos no país.
No Brasil o
uso de crianças para trabalho escravo ocorre em larga escala, sendo amplamente
utilizado por ricos fazendeiros que por vezes são políticos conhecidos,
indústrias carboníferas, canaviais, etc. Elas são oriundas de sequestros
realizados em várias regiões do país, ás vezes de outros países e permanecem por anos confinadas, ficam doentes,
morrem e só é noticiado quando alguém consegue fugir do cativeiro e denunciar à
polícia, quando então o responsável é autuado.
Na mesma
escala está o trabalho infantil, proibido no país, segundo a Convenção 138 do
qual o Brasil é signatário, que determina que o país membro não deve medir
esforços para combater essa prática. A
exploração do trabalho infantil, difere do trabalho escravo, ocorre em
ambientes domésticos, no comércio, zonas rurais, etc. e não está diretamente
ligado ao tráfico de pessoas, embora a criança também fique refém de adultos
inescrupulosos.
O tráfico de órgãos é um verdadeiro
tabu. Assunto proibido, visto pela grande sociedade como lenda, mas existe e
foge ao controle das autoridades brasileiras. Não há fiscalização nem controle
nos hospitais e IMLs do país. Órgãos são retirados, desviados (roubados) e tem seu peso cotado a ouro. Quem precisa de transplante, tendo
dinheiro, não se importa em pagar preços exorbitantes por
um órgão que poderá lhe salvar a vida ou de um filho.
O governo precisa criar controles rígidos para
fiscalizar os captadores de órgãos. Além
dos desvios (roubos) de órgãos de doadores falecidos, ocorrem também mortes induzidas
para atender as quadrilhas. Além disso, ainda temos a questão da falta de
controle para saber se o órgão de um doador vai realmente para a fila de
espera, que atualmente ultrapassa 60 mil pessoas no Brasil, ou para uma lista
paralela, que segundo denúncias, conteria
o nome de pessoas de maior poder aquisitivo.
Também existe a venda de órgão pelo
próprio indivíduo, prática proibida no país. No relatório da CPI do tráfico de
Órgãos, consta uma quadrilha que era comandada por um ex major do exército de
Israel, que oferecia até dez mil reais
por rim, aos moradores de Recife. Os ‘’doadores’’ eram levados à África do Sul
para retirada do órgão, que depois seria comercializado em dólares.
4 – Em sua opinião o que ainda falta para o efetivo combate a esse
crime?
DB – O Brasil precisa de políticas mais sérias para combater esse crime; precisa de delegacias especializadas em todas as cidades de
médio e grande porte, com equipes preparadas na investigação de pessoas desaparecidas,
sequestradas e aliciadas pelas redes do bilionário comércio do tráfico de
pessoas e também psicólogos para darem apoio aos pais que ficam a mercê de um
sofrimento desumano quando o filho desaparece. É preciso uma conscientização das
massas, através de campanhas esclarecedoras, alertando sobre os perigos que
envolvem a segurança das crianças, É preciso uma ação mais enérgica e corajosa do
governo federal e estadual que inibam as ações de quadrilhas que agem em nosso
território e uma justiça mais atuante que não se corrompa. Precisamos de maior
rigor na lei, que após prender o traficante, ele fique afastado da sociedade
por um período de anos bastante longo. Infelizmente, o grande problema recai
sobre a corrupção de policiais, autoridades e políticos, que ‘’fecham os olhos’’
mediante gordas gratificações permitindo a continuidade desse crime hediondo
que assola nosso país.
5 – Qual País combate de modo mais efetivo o Tráfico de Crianças?
DB - Segundo relatório divulgado pelo Escritório das Nações Unidas para o
Combate às Drogas e ao Crime (UNODC), o tráfico de pessoas é o terceiro negócio
mais rentável e movimenta cerca de US$ 32 bilhões, fazendo dois e meio milhões de vítimas todos os anos,
onde 27% são crianças e dois terços dessas crianças são do sexo feminino.
As estatísticas para o tráfico de
crianças a nível mundial são:
- Europa e Ásia Central: 16%;
- Continente Americano: 27%;
- Sul, Leste Asiático e Pacífico:
39%;
- Médio Oriente e África: 68%.
Houve um progresso na legislação
internacional referente ao tráfico de pessoas. 83% dos 154 países que
participam do Protocolo, agora têm leis que criminalizam o tráfico de pessoas (Protocolo para Prevenir, Suprimir e Punir o Tráfico de
Pessoas, Especialmente Mulheres e Crianças, de 2003). Os objetivos são assistir
e proteger as vítimas do tráfico de pessoas, com pleno respeito pelos direitos
humanos e combater o tráfico em si. Em 2006 o Brasil aprovou a Política
Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas.
Segundo Relatório
Global sobre Tráfico de Pessoas de 2012, no período entre 2007 a 2010, aumentou
em 7% o tráfico de crianças em relação ao período 2003/2006. O número de
meninas vítimas do tráfico também aumentou de 15 para 20% do total.
A falta de
dados concretos não permite um número aproximado, mas estima-se que ultrapassem
os milhões.
Outro dado
alarmante do relatório é pelo baixo índice de condenações: 16 por cento dos
países que forneceram dados, não registraram nenhuma condenação por tráfico de
pessoas entre 2007 e 2010.
DB Nota final: ” A criança e adolescente,
conforme determina o art. 18 do ECA deve estar protegida de todo e qualquer
tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório e constrangedor,
garantindo assim sua dignidade.”
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